Dispensa de motorista com câncer de rim é considerada discriminatória
Publicado em 11 de abril de 2024
A empresa não conseguiu provar outro motivo para o ato.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho condenou a Expresso São Miguel Ltda., de Cascavel (PR), a indenizar um motorista dispensado durante tratamento de câncer. O colegiado reafirmou a jurisprudência do Tribunal de que o empregador deve provar que houve um motivo plausível para a dispensa, caso contrário presume-se que é discriminatória.
Cirurgias
Admitido em junho de 2013, o motorista passou por duas cirurgias no ano de 2017. Na primeira, retirou um câncer no rim e, quatro meses depois, passou por outra cirurgia para tirar outro câncer no músculo da coluna. Ele retornou ao trabalho, continuou o tratamento, mas foi dispensado em maio de 2019.
Na reclamação, ele disse não ter dúvidas que sua dispensa foi discriminatória, por ter ocorrido após a empresa tomar ciência dos seus problemas de saúde e avisar que precisaria se afastar pelo INSS. Na visão do trabalhador, a conduta da Expresso foi abusiva ao despedi-lo em um momento em que estava com a saúde debilitada.
Corte de gastos
Em contestação, a empresa sustentou que reduzira seu quadro funcional, fechando duas linhas e dispensando, além do motorista, mais três empregados. A Expresso afirmou ainda que não tinha ciência da doença ao demiti-lo.
Comprovação
Para a 3ª Vara do Trabalho de Cascavel e o Tribunal Regional do Trabalho, a discriminação não ficou comprovada. Para o TRT, o câncer não gera estigma ou preconceito, não causa hostilidade, rejeição ou repugnância ao trabalhador. Além disso, não é uma doença infectocontagiosa, como o HIV.
Ônus
Também, segundo a decisão, o motorista deveria ter comprovado suas alegações. “Não era ônus da empresa comprovar a existência de uma causa efetiva que a tenha levado a encerrar o contrato de trabalho do motorista, mas sim do empregado comprovar, de forma cabal, que foi demitido por questões discriminatórias”.
Súmula
O ministro Alberto Balazeiro, relator do recurso da empresa, observou que, de acordo com a jurisprudência do TST (Súmula 443), é discriminatória a dispensa quando a doença causa estigma ou preconceito. Nessa circunstância, o trabalhador não tem o ônus de comprovar a discriminação. “O TRT errou ao não considerar a doença estigmatizante e errou ao atribuir o ônus da prova ao trabalhador”, observou.
Conduta mascarada
Ao afastar o ônus da prova do motorista, o ministro explicou que o empregador está em condições mais favoráveis de produzi-la. “É extremamente difícil ao empregado demonstrar a conduta discriminatória do empregador, sobretudo porque ela é discreta ou mascarada por outras motivações”.
Segundo o ministro, o empregador deve indicar algum motivo para a dispensa, o que não ocorreu nos autos. A seu ver, o fato de três colegas também terem sido dispensados na mesma época não é suficiente para demonstrar que não houve discriminação.
Com a decisão, o caso deve retornar ao Tribunal Regional para que sejam examinados os pedidos do empregado de reintegração e indenização por dano moral.
(Ricardo Reis/CF)
Processo:
RR-1055-45.2019.5.09.0195
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho
Ministros do TST consideram ilegal vincular ida ao banheiro a Prêmio de Incentivo Variável
Publicado em 11 de abril de 2024
Relator: “É manifestamente ilegal vincular remuneração a idas ao banheiro”.
Em julgamento realizado nesta quarta-feira (10), a Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reprovou a conduta ilegal de algumas empresas de vincularem a ida de trabalhadores ao banheiro a cálculo do Prêmio de Incentivo Variável (PIV).
A discussão ocorreu no julgamento do recurso de uma teleatendente da Telefônica Brasil S.A, de Araucária – PR, indenizada em R$ 10 mil por dano moral. Para o relator, ministro Alberto Balazeiro, a prática representa abuso de poder e ofende a dignidade da trabalhadora.
Pressão
Na ação trabalhista ajuizada em novembro de 2020 contra a Telefônica, a teleatendente disse que seu supervisor controlava “firmemente” as pausas para idas ao banheiro e que elas afetavam o cálculo do prêmio. Segundo ela, o PIV do supervisor depende diretamente da produção de seus subordinados e, dessa forma, havia muita pressão, humilhação e constrangimento para manter a produtividade.
“Para manter a premiação, os supervisores impediam os empregados de irem ao banheiro conforme suas necessidades”. A trabalhadora afirmou que não era raro o supervisor ir até o banheiro buscar o empregado.
PIV
No regulamento da empresa, o PIV é assim definido: “O PIV (Programa de Incentivo Variável) tem como objetivo incentivar e reconhecer o desempenho do colaborador em relação aos resultados, através de uma remuneração variável mensal paga em função do atingimento de metas, conforme os critérios e condições definidos na presente política”.
Tempo real
Ainda de acordo com a teleatendente, o sistema da empresa indica, em tempo real, as pausas que os subordinados fazem, também sinalizando, imediatamente, o chamado “estouro de pausa”. Quando isso acontecia, o supervisor encaminhava um e-mail com relatório de produtividade e de estouro de pausas para toda a equipe, o que ocasionava assédio e exclusão pelos demais empregados. Com isso, a teleatendente disse que se considerava uma “trava” da produtividade da equipe, gerando atrito entre os empregados.
Telefônica
Em contestação, a Telefônica qualificou como inverídicas as alegações da atendente, “cujo único objetivo é de se locupletar às custas desta em detrimento à sua imagem frente à Justiça Especializada”. Disse que sempre tratou a atendente e toda a equipe com profissionalismo e polidez e que “não há controle de tempo na utilização do banheiro, mas, evidentemente, há uma organização mínima do trabalho a fim de garantir o atendimento ao cliente”.
Banheiro
A defesa afirmou que o tempo gasto no banheiro pela empregada jamais foi considerado para fins de pagamento da parcela variável ou como forma de pressão para o atingimento de metas. “O fato de a variável do supervisor receber influência da atuação de sua equipe, por si só, não comprova a ocorrência de dano moral ou que os limites do poder diretivo foram extrapolados”, alegou a empresa.
Sentença
Para a 16ª Vara do Trabalho de Curitiba (PR), a conduta mais gravosa da Telefônica decorre da fórmula de cálculo de prêmios. “Adotando o PIV como complemento de remuneração, calculado sobre produtividade do empregado, a empresa acabou por criar uma corrente vertical de assédio. Isso porque o PIV do supervisor depende diretamente da produção de seus subordinados”.
Repercussão negativa
Entendimento contrário teve o Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, que, apesar de acolher a tese de que as idas ao banheiro afetavam “indiretamente” o PIV, declarou que não havia repercussão negativa na avaliação funcional da atendente ou no pagamento de salários.
Para o TRT-9, não houve prova de proibição para que a empregada fizesse suas necessidades fisiológicas além das pausas previstas. “A própria autora informou em seu depoimento que podia ir ao banheiro”, ressalta a decisão.
Ilegal
Durante o julgamento nesta quarta-feira, o ministro Alberto Balazeiro, relator do recurso da atendente, disse que a conduta reiterada das empresas em relacionar as idas ao banheiro ao cálculo do PIV tem gerado grande quantidade de processos sobre a matéria. “A política é manifestamente ilegal”. Segundo ele, não há dúvidas de que havia essa vinculação, “prática que representa abuso de poder diretivo”.
O ministro prosseguiu afirmando que o empregado ou a empregada não tem condições de programar as idas ao banheiro e, ao evitar a satisfação de necessidades fisiológicas por causa de repercussão em sua remuneração, pode desenvolver problemas sérios de saúde. “Ninguém tem controle por se tratar de natureza fisiológica”, concluiu.
O voto do ministro foi seguido por unanimidade pela Turma.
A Telefônica ainda pode recorrer contra a decisão.
(Ricardo Reis/GS)
Processo:
TST-RR-992-38.2020.5.09.0016
Fonte: Tribunal Superior do Trabalho
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