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Gestão: Pessoas e Trabalho – 40

26 de março de 2024
Informativo
O controle de ponto por exceção é válido?

Publicado em 25 de março de 2024

Por José Luiz Cardoso e Ana Luísa Dantas

Variação à regra geral de registro obrigatório de jornada, o controle de ponto por exceção permite que o empregador realize apenas o registro de faltas, atrasos, saídas antecipadas, entradas tardias ou inconsistências no gozo dos intervalos, dispensando o registro quando o empregado trabalhar dentro da jornada regular.

Ou seja, por esse sistema, o empregador não está desobrigado de controlar a jornada extraordinária dos empregados, mas apenas de anotar os horários de entrada e saída que não variarem da jornada regular.

Uma das primeiras normas que tratou do tema, ainda no âmbito administrativo, foi a Portaria nº 1.120/1995, do antigo Ministério do Trabalho e Emprego, estabelecendo a possibilidade de adoção de sistemas alternativos de controle de jornada, desde que autorizados por convenção ou acordo coletivo de trabalho. Mesmo a Portaria nº 373/2011, que revogou a anterior, manteve a permissão em seu artigo 1º.

Quase oito anos depois, finalmente entrando na esfera do Poder Legislativo, foi editada a Lei de Liberdade Econômica (Lei nº 13.874/2019), trazendo para a CLT o artigo 74, § 4º, que expressamente autoriza o empregador a adotar o controle de ponto por exceção, desde que mediante acordo individual com o trabalhador, ou através de convenção ou acordo coletivo de trabalho com o sindicato.

A implementação do ponto por exceção através de negociação coletiva encontra respaldo não apenas no artigo 7º, inciso XXVI, da Constituição, que traz o reconhecimento das normas coletivas como um direito do trabalhador, como também no artigo 611-A, inciso I, da própria CLT, que dispõe sobre a prevalência da convenção ou acordo coletivo de trabalho sobre a lei quando dispuser sobre jornada de trabalho.

No entanto, em que pese se tratar de uma relevante inovação, o Tribunal Superior do Trabalho (TST), que antes desta lei já se mostrava reticente em aceitar essa forma de controle de ponto, mesmo quando negociada com o sindicato, continuou caminhando no sentido da invalidade do controle de ponto por exceção, mesmo após a inclusão do §4º no artigo 74 da CLT.

Registro de ponto nem sempre é facultativo

Segundo a Corte Superior do Trabalho, o artigo 74, §2º da CLT, estabelece o dever de anotação dos horários de entrada e saída dos empregados em estabelecimentos que possuam mais de dez empregados e, sendo uma norma de ordem pública, não seria possível facultar ao empregador adotar ou não o registro de ponto, sob pena de ferir dispositivo de lei que assegura a segurança e a saúde física e mental do trabalhador.

Em outras palavras, mesmo diante da previsão constitucional do direito à negociação coletiva, insculpida no artigo 7º, XXVI, da Constituição, o TST relativizou essa garantia, sustentando que as cláusulas previstas nos instrumentos coletivos devem observar as normas de ordem pública[1].

Este cenário, entretanto, sofreu uma importante alteração, quando o Supremo Tribunal Federal, por meio da decisão proferida no Recurso Extraordinário com Agravo nº 1.121.633, publicada no dia 28/04/2023, fixou a tese de que “são constitucionais os acordos e as convenções coletivas que, ao considerarem a adequação setorial negociada, pactuem limitações ou afastamentos de direitos trabalhistas, independentemente da explicitação especificada de vantagens compensatórias, desde que respeitados os direitos absolutamente indisponíveis”.

Nesta decisão, o STF reafirmou a supremacia do negociado sobre o legislado, ao decidir que acordos ou convenções coletivas de trabalho que limitam ou suprimem direitos trabalhistas são válidos, desde que seja assegurado um patamar civilizatório mínimo ao trabalhador e respeitados os direitos absolutamente indisponíveis.

Como efeito desta decisão, o TST revisitou seu antigo entendimento, proferindo acórdãos que expressamente validam a marcação de ponto por exceção.

Citamos, como exemplo desta mudança de posicionamento, um caso recente, julgado em fevereiro de 2024 pela 5ª Turma do TST, que analisou um processo no qual o TRT de Minas Gerais afastou a validade da norma coletiva que autorizava a marcação do ponto por exceção, sob o fundamento de que o artigo 74, §2º, da CLT é norma de ordem pública, não passível de flexibilização por acordo coletivo.

A 5ª Turma deu provimento ao recurso da empresa para decretar, nos termos da tese fixada pelo STF, que é válida norma coletiva que limita ou restringe direitos trabalhistas, desde que não sejam absolutamente indisponíveis, hipótese verificada naqueles autos.

Além disso, a decisão destacou que o artigo 611-A, X, da CLT estabelece que a norma coletiva terá prevalência sobre a lei que dispuser sobre modalidade de registro de jornada de trabalho. Com isso, o TST reformou a decisão proferida pelo TRT, por considerar que, não se tratando de direito indisponível, há de ser privilegiada a autonomia das partes [2].

Segue sendo preciso observar, contudo, qual será o entendimento firmado pelas demais turmas do Tribunal Superior do Trabalho sobre a matéria. De toda sorte,  considerando a decisão da 5ª Turma do TST que espelha o precedente firmado pelo STF no ARE nº 1.121.633, parece ser possível enxergar um norte favorável à validade da implementação do ponto por exceção pelas empresas, com maior segurança jurídica.

[1] TST – AIRR –  Processo nº 2840000-33.2007.5.09.0008, 7ª Turma, Relator: Cláudio Mascarenhas Brandão, Data de Julgamento: 27/02/2019, Data de Julgamento: 08/03/2019.

[2] TST – RR: – 11685-03.2017.5.03.0033, Relator: Breno Medeiros, Data de Julgamento: 21/02/2024, 5ª Turma, Data de Publicação: 23/02/2024.
Fonte: Consultor Jurídico

 

A pressão pela igualdade feminina foi longe demais?

Publicado em 25 de março de 2024

Por Pilita Clark

A colunista Pilita Clark escreve sobre a visão atual da luta feminista, e a percepção, para alguns, de que ela já alcançou o que deveria.

Este mês, o povo da Irlanda fez algo chocante. Votou esmagadoramente pela não promoção da igualdade feminina. Em 8 de março, Dia Internacional da Mulher, 73,9% votaram contra mudar uma parte da Constituição irlandesa, de 87 anos, que na verdade diz que lugar de mulher é em casa.

A cláusula ofensiva declara: “O Estado reconhece que através de sua vida no lar, a mulher dá ao Estado um apoio sem o qual o bem comum não poderia ser alcançado. O Estado, portanto, deve esforçar-se por garantir que as mães não sejam obrigadas por necessidade econômica a trabalhar, negligenciando os seus deveres no lar”.

Os eleitores foram convidados a abandonar essa bobagem arcaica e aprovar uma nova cláusula dizendo que o Estado teria como objetivo apoiar a prestação de cuidados “por parte dos membros de uma família uns aos outros”. Mas os eleitores não fizeram isso.

Uma série de explicações foram oferecidas para o maior voto “não” da história dos referendos na Irlanda.

Havia receios de que a mudança consolidasse a ideia de que cuidar é uma responsabilidade particular familiar e não remunerada, sem garantia do apoio estatal. A emenda era difícil de ser explicada. A campanha pelo “sim” foi desigual.

Mais de dois terços (67,7%) dos eleitores também rejeitaram uma emenda separada que teria reconhecido que as famílias são baseadas em “relações duradouras”, e não só no casamento.

Mas a votação sobre os “deveres domésticos” das mulheres ainda foi um choque, até porque se trata da Irlanda. O país tem uma boa pontuação nos rankings europeus de igualdade de gênero e mais de 60% de seus eleitores concordaram em legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo em 2015 e revogar a proibição do aborto em 2018.

Mais especificamente, este não é o único sinal de que a marcha pela igualdade feminina parece difícil. A Irlanda é um dos 31 países cobertos pela nova pesquisa do Instituto Global para a Liderança Feminina do King’s College London e o grupo de pesquisas Ipsos, que constatou várias coisas que eu não esperava ver em 2024.

Quando se trata de conceder às mulheres direitos iguais aos dos homens, preocupantes 53% acreditam, agora, que as coisas foram longe demais em seu país, contra 42% em 2019. A mudança é evidente em países que vão da Tailândia e Peru à Suécia e Reino Unido.

Quase metade da população britânica concorda que o esforço pela igualdade das mulheres é um trabalho concluído – contra menos de um terço que pensava assim cinco anos atrás. E pior: 47% dos britânicos acreditam que fizemos tanto para promover a igualdade das mulheres que estamos discriminando os homens. Uma parcela parecida pensa do mesmo modo na Irlanda (45%) e globalmente (46%).

Como seria de esperar, os homens tendem a pensar mais isso do que as mulheres. Mas você pode se surpreender com “quais” homens. Acontece que alguém da geração Z, que ainda não completou 30 anos, tem muito mais probabilidade de ter essas opiniões do que um “baby boomer” com duas vezes a sua idade.

Não está exatamente claro o que está motivando essas opiniões. Podem ser apresentados argumentos convincentes sobre as pressões econômicas, o aumento da desigualdade e a polarização nas redes sociais. Mas uma coisa é certa: se os homens realmente estão sendo discriminados, os perpetradores dessa discriminação estão fazendo um péssimo trabalho.

A igualdade feminina melhorou em muitas partes do mundo, especialmente na educação. Há anos que estudantes do sexo masculino estão em menor número nos campi universitários em muitos países. Mas isso ainda não se traduziu no nirvana da igualdade.

Globalmente, as mulheres ainda ganham 77 centavos de dólar para cada US$ 1 pago aos homens e passam uma média de 2,4 horas a mais por dia em trabalhos de cuidados não remunerados.

Embora mais de um terço dos países já tenha tido uma mulher na liderança, os dados mostram que, em qualquer momento, a parcela dos países onde o líder mais poderoso é uma mulher nunca passou de 10%.

No ritmo atual de progresso, estima-se que serão necessários 162 anos para que as mulheres alcancem a igualdade política com os homens. Levará ainda mais tempo para o fim da desigualdade econômica, que alimenta a violência física ou sexual que quase um terço das mulheres experimentam em suas vidas. E assim vai.

Nada disso significa que deveríamos ignorar o que os homens pensam da igualdade feminina. Longe disso. Quanto mais evidências vemos de atitudes endurecidas, mais precisamos nos esforçar para entender o porquê. Porque uma coisa é certa: a desigualdade feminina ainda é muito real e o já longo esforço para subvertê-la ainda tem muito mais pela frente.
Fonte: Valor Econômico
 
 


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